Envelope de ideias
"...
E agora, diante da Tânger Soto, pensava na mulher da escuna. No fim de contas, disse para consigo, talvez uma e a outra sejam a mesma, e a vida dos homens gire sempre em torno de uma só mulher: aquela onde se resumem todas as mulheres do mundo, vértice de todos os mistérios e chave de todas as respostas. Que maneja o silêncio como ninguém, talvez por ser uma linguagem que, há séculos, fala na perfeição. A que possui a lucidez sábia de manhãs luminosas, de ocasos vermelhos e mares azul-cobalto, temperada de estoicismo, tristeza infinita e fadiga para as quais - Coy tinha essa estranhe certeza - uma única existência não basta.
..."
O Cemitério Dos Barcos Sem Nome
Arturo Pérez-Reverte
Um dia pensei-o com bastante claridade, ele, além disso, executou-o em palavras. São assim os grandes escritores: tochas fulgorosas, desgastando a penumbra que tolda certos sentimentos. Equacionam ideias em parágrafos, para que estas se tornem transmissíveis, e posteriormente, no coração de cada receptor, novamente as ideias originais (ou quase). Matemáticos de palavras. Envelopes sem destinatário, onde os sentimentos, dobrados em quatro, viajam de Homem para Homem.